23 de abr. de 2009

De mãos dadas com Deus II – Cap I

Capítulo I

Ouvindo Rita falar sobre seus sentimentos, reparei que ela não era mais a minha menininha, ela já era uma moça, estava com 17 anos, e, como toda moça, queria arrumar um namorado. Mas ela não ia a lugares onde pudesse conhecer rapazes, e, portanto tornava-se quase impossível que seu sonho se tornar realidade.

Eu me senti de pés e mãos amarradas, pois, desta vez eu nada podia fazer, a realização desse sonho não dependia de mim, dependia apenas do destino.

Quantas e quantas vezes, ao ouvi-la desabafar, sobre sua solidão, meu coração sangrava e vinha novamente àquela impotência de nada poder fazer.

Todo o sofrimento de minha filha me impelia a pensar no que poderia ser feito para ajudá-la.

A cada desabafo seu, eu pedia a Deus que tivesse pena da minha filha. Explicava a Ele que ela só almejava o que qualquer moça almeja... Ter um namoradinho.

Eu rezava, rezava muito pedindo ao Criador que tirasse minha filha da solidão terrível em que se encontrava.

Comecei a sair com bastante freqüência com ela, pois pensei que se ela saísse bastante sua solidão diminuiria.

Mas, um dia ao convidá-la para ir ao shopping comigo, ela meigamente me disse:

- Mãe você promete que não fica zangada comigo?

Respondi que ela podia falar o que quisesse que eu não me zangaria, e ela continuou...

- Não fica zangada viu, mas, eu não quero mais sair com uma pessoa velha.

Como eu poderia me zangar com ela se compreendia tão bem seus sentimentos, se compreendia tão bem o que ela queria expressar ao dizer isso. Sabia que ela me amava, mas, como todo jovem, queria a companhia de outros jovens.

Os lábios de Rita foram deixando de sorrir, seus olhos ficaram cheios de tristeza.

Uma tarde ela sentou-se ao meu lado e disse:

- Mãe eu sei que sou diferente, sei que os rapazes não me olham com interesse, quando me olham, me olham por curiosidade, sei que um rapaz “normal” não vai querer namorar comigo porque sou Down.

Jamais havia pensado que pela cabecinha da minha filha, tão jovem ainda, houvesse um raciocínio tão lógico.

Ela compreendia que era diferente, compreendia que os rapazes “normais” não a olhavam com interesse e comprendia também, que eles não a iriam namorá-la por ter síndrome do Down. Todo esse entendimento era muito forte para uma mocinha com a idade dela, ele poderia levá-la a depressão.

Muito preocupada comecei a rezar.

A oração que sempre fizera parte de minha vida, daquele momento em diante se intensificou ainda mais.

Certo sábado, Eduardo entrou na sala, onde eu me encontrava, se aproximou de mim, agachou-se, segurou minhas mãos, e disse com muito tato:

- Mãe, eu e a Giu, fomos a uma feira beneficente numa escola para portadores da síndrome de Down.

Eu percebi onde ele queria chegar e por isso, o interrompi falando:

- Vocês fizeram muitas compras?

Ele não respondeu minha pergunta continuou:

- Lá há muitos rapazes e moças iguais da Rita. Eu os vi trabalhando nas barracas, eles são muito alegres.

Novamente eu o interrompi, não queria ouvir o que eu sabia que ele iria me dizer. Disfarçando perguntei:

- O que vocês compraram na feira?

Ele deu uma pausa, como se precisasse criar coragem, respirou fundo e sem responder a minha segunda pergunta, continuou:

- Mãe, não se magoe com o que eu vou falar, mas, se você colocar a Rita lá ela vai fazer novas amizades e vai ser mais feliz.

Tirou do bolso, um papel dobrado, continuou:

- Olha, anotei nesse papel o nome e o telefone da escola.

Ao pegar aquele papel apoderou-se de mim uma tristeza infinita.

Creio que Eduardo percebeu, pois me deu um beijo, e nesse momento percebi seus olhos cheios de lágrimas.

Ele me abraço com força me deu um beijo na testa e saiu.

Compreendi que apesar de meu filho nada dizer quanto à solidão de sua irmã, ele estava tão preocupado quanto eu com a tristeza que se apossara dela.

À noite, quando todos dormiam, pequei novamente aquele papel, abri e fiquei olhando para ele, senti lágrimas quentes escorrerem pelo meu rosto. Perguntei a mim mesma, de que adiantara ter lutado tanto pela inclusão de minha filha em escolas comuns, ter ido noites e noites de mochila, enfrentado as dores nas costas, às aulas junto com ela, de que adiantara todos os esforços feitos por mim para dar-lhe uma profissão, ter ido aprender computação, para depois a ensinar a mexer com o computador. Que adiantava ela saber com perfeição “passear” pela internet, mandar e receber e-mails, trabalhar com o programa de texto Word fazendo digitação escolar, cartões de visita e etiquetas, de que adiantara a minha luta durante todos aqueles anos pela inclusão de Rita na sociedade, se agora eu “precisava” colocá-la numa escola especial para que ela tivesse amigos.

Com aquele endereço nas mãos me ajoelhei e rezando falei para Deus:

- Deus, não importa meus sentimentos, eles nada valem, mostra-me o caminho que devo seguir para que minha filha seja feliz.

Após essa breve prece, levantei-me e fui para cama, mas lá continuei a rezar, como das outras vezes, depois de muito rezar e chorar, cansada, adormeci.

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Um comentário:

Ana Suzuki disse...

Este capítulo é especialmente triste, posso imaginar o desconsolo de uma mãe que se esforçou tanto mas o que vem a seguir é curiosidade, porque não sei de muitos detalhes. Um abraço,
Ana Suzuki